terça-feira, novembro 13, 2007

Tournée du Chat Noir


Moribundo, bem sei que o teu sonho era seres pianista numa casa de putas, mas enquanto não aprendes a tocar piano, e eu não deixo os cigarros, que me deixam a voz maviosa tão rouca, que tal irmos dar uma voltinha.
Há coisa de meses fui a um espectáculo espantoso... recordo-me dele como se de um sonho se tratasse. Entrei por uma porta minúscula, tapada por uma cortina pesada de veludo vermelho (não, não era uma casa de putas! Achas-me com cara de quem frequenta casa de putas?) e do lado de lá era um espaço amplo maravilhoso! Os tectos altos, e alvos, com intrincados motivos impressos no gesso, um palco ao fundo, cheio de luz e som... e aquele ambiente de fumo que eu tanto detesto, que me deixa os olhos a arder e as roupas a cheirar a tabaco... tu sabes! E enquanto entrava, um mimo vestido de mordomo fez-me uma vénia, como quem diz "Faça favor de passar mademoiselle, estamos todos à sua espera"... senti-me especial. Há pequenos pormenores, tão insignificantes na sua pequenez, que nos fazem tão felizes! E aquele pequeno gesto é representativo de uma estrutura de marqueting tão bem pensada e eu... já estou a teorizar outra vez! Passei o mimo, e dirigi-me a uma mesa num canto. Mal me sentei o empregado solícito acercou-se, e sem nada dizer aguardou que pedisse: Um Daiquiri, se faz favor.
O ambiente era escuro, convidava à reflexão. Acendi um cigarro e fiquei a ver o fumo desfazer-se em volutas de azul. Subitamente todos se calaram. Acendeu-se uma luz, e tu, sim tu! Tu entraste vestido de fraque! Fizeste uma vénia ao público e encaminhaste-te para o piano de cauda preto que estava no centro do palco. É engraçado, pensei eu, não fazia a mais pálida ideia que sabias fazer vénias com tal elegância, nem que tocavas tão bem. Repentinamente, levanto-me e encaminho-me para ti. Piscas-me o olho em aprovação, tiro o casaco pesado que trazia ao ombros, e começo a cantar! É a minha voz que oiço, mas não é a minha voz que canto! E aquelas músicas! Não as conheço de lado nenhum... São tão diferentas, a estrutura melódica é tão diferente do que estou habituada a ouvir.
Sinto que o público gosta de nos ouvir, que se deixam embalar pelo nosso sonho. E repentinamente falha o sistema de som, apaga-se a luz... e o público canta connosco! Maravilhoso.

13 comentários:

sethyoder disse...

foi giro imaginar a cena...gostei;)

Hydrargirum disse...

Que texto fabuloso....!

Por uns momentos, fui atirado à Place du Tertre em Montmartre, num qualquer botequim duvidoso cheio de boémios convidativos ao sabor da vida...

Estive lá...e tu descrevest-o!!!

A figura do T.Lautrec incentivou ao cenário...

Mas...isto é uma adaptação de algo vivido por ti...ou é fruto da tua imaginação?

M disse...

Ainda bem que gostaram! Espero continuar a produzir textos engraçados e melhores!!! :)

Hydra... mistério! ;)

Pearl disse...

Bonito, muito bonito...
Passo por cá uma vez e encontro um texto fantástico, envolvente!!!

Gostei mesmo!!!

:o)))***

CatDog disse...

Take dois, que a tentativa anterior foi parar ao espaço...
Eu não encontrei ambientes fumarentos na noite parisiense (eles devem inestir à brava em exaustores), mas encaixo alguns bares e casas de alterne da noite da Grande Lisboa na tua descrição.
Ocorreu-me o Ritz Club, por exemplo, onde não havia putas mas não faltavam mulheres ousadas e a música acontecia feliz.
Evocaste-me pedaços de existência divertidos e por isso confesso-me muito agradecido por esta magnífica experiência completamente grátis.
Andas inspirada. Inspira. E depois aguenta a respiração. :)

CatDog disse...

Investir, investir...

M disse...

Pearl, bem vinda ao blog! Espero continuar a escrever coisas engraçadas, mas nunca se sabe, é por ondas!

CatDog, ainda bem que escreveste investir, porque a minha primeira interpretação foi para inexistir... Onde ando com a cabeça!
Caríssimo, fico contente por saber que passaste um bom momento a ler o meu texto. É para isso que ele aí está! Para divertir os meus leitores!

mik@ disse...

es senhora pra um dia destes nos brindar cm um belo livro :)
se a carolina salgado conseguiu... tu ainda es capaz de ser premio nobel :)
o texto ta lindo... e dar largas a mente e cada um faz o seu proprio filme

M disse...

Ó mik@... tantos elogios não, que depois fico insuportável! :)
Muito obrigado pela tua opinião, és uma querida e todas as cobrinhas ficaram envaidecidas de prazer!
Também acho que o que é melhor num texto é aquilo que se deixa por dizer, para cada um poder voar até onde lhe apetecer!

mik@ disse...

eheheh nao fiques insuflada.

tolkien considero um genio digno de premio nobel, aquele senhor criou um mundo.

recomendo-te filipe faria, escritor portugues dentro do mesmo genero, ja tem 5 livros publicados. o proximo so sai pro ano :( snifff

Anónimo disse...

Muito bom...
Em Coimbra, não me recordo de nenhum espaço assim, embora haja muitas tascas com mulheres duvidosas...já em lisboa, há uns quantos cabarets que quase encaixavam nesse sonho/memória...

Anónimo disse...

Entrei,senti e gostei:) A descrição está encantadoramente deliciosa...Montmartre Montmartre...

Anónimo disse...

Filipe Faria...as cronicas da allarya...acabei de me lembrar que ainda nao adquiri o 5ªvolume...já tenho saudades