Para quem ainda não sabe, porque se encontra desatento, ou não liga nenhuma a estas coisas (apesar da ignorância da lei não servir como causa de desculpabilização de condutas, nem sequer como atenuante), três dos mais importantes diplomas legais do nosso país foram amplamente alterados: o Código Penal, o Código de Processo Penal e o Código de Processo Civil. Não foi pedida opinião a grupos de discussão quanto às novas medidas adoptadas nem se conhecem relatórios que certifiquem a bondade/eficácia das novas medidas, algumas delas radicamente contrárias às que se encontravam em vigor.
Ontem, dia 15 de Setembro o CPP e o CP alterados entraram em vigor, volvidos apenas 15 dias da publicação dos diplomas que os alteraram. Apenas 15 dias! Vêm os juristas de férias judiciais e têm um presente envenenado nas suas secretárias.
Ainda estou com a cabeça entre as mãos a estudar as alterações que fizeram aos diplomas que não eram perfeitos, mas equilibrados nas garantias de segurança que davam aos arguidos, em consonância com o princípio In Dubio Pro Reu, e com os poderes que dava aos órgãos de polícia criminal, na investigação dos factos indiciados como ilícitos penais.
O nosso CPP tinha falhas, quase nada funcionava bem, mas aquilo que mais se ouvia era a falta de coordenação dentro das entidades de polícia criminal e os procuradores do Ministério Público. Dizia-se que tínhamos legislação teoricamente muito perfeita, mas que na prática se revelava uma dor de cabeça: especialmente porque nos processos envolvendo arguidos mediáticos ou protegidos por determinados lobbies, era fácil encontrar excepções e erros processuais que arrastassem os processos nos tribunais durante anos. Atentem no Caso "Casa Pia", nas "FP25", "Fátima Felgueiras", "Apito Dourado"...
E não deixa de ter a sua piada, mas o código funcionava para a chamada pequena e média criminalidade, aliás, frequentemente achei que a bagatela criminal era sobre-valorizada, com condenações em pena de multa de cenas de chapadas, bebidas frescas atiradas às caras dos ofendidos, honra e integridades morais feridas por "putas" e "cabras" frequentemente bem apelidadas...
Mas voltemos às mudanças.
O processo penal deixou de ser secreto, a regra é a publicidade do processo: o arguido, assistente, ofendido que deseje manter o processo em segredo de justiça durante a fase de inquérito - a fase investigatória por excelência - terá de requerer ao Ministério Público ou ao Juiz de Instrução que o faça. Já podemos imaginar a quantidade de requerimentos que vão dar entrada nos Departamentos de Investigação e Acção Penal destes país. Já agora, contará como intervenção para os advogados estagiários?
As regras da aplicação de medidas de coacção, nomeadamente a prisão preventiva também foram substancialmente alteradas. Para quem não saiba, só se pode decretar a prisão preventiva quando o crime em causa tiver uma moldura penal que preveja a condenação do arguido em mais de 5 anos de prisão. Já a pensar nisso muitos foram os crimes que passaram de 3 para 5 anos na respectiva moldura penal.
Mas caricato e assustador é a alteração do período máximo a que se pode estar coagido com prisão preventiva: anda meio mundo assustado com a possibilidade de saída em liberdade do criminoso que matou aqueles polícias na Amadora, e do Cabo da GNR de Santacombadão que matou três adolescentes (condenados em tribunal de 1ª instância, mas cuja decisão ainda não transitou em julgado porque ambos interpuseram recurso).
Não sei quanto tempo de prisão preventiva já cumpriram estas personagens, mas a confirmar-se a sua possível saída, só nos resta soltar uma gargalhada e dizer: É a vida, ou ao estilo Allen "It's like anything else".