Até sou uma pessoa razoavelmente bem disposta. Certo, acordo de manhã e digo: "Fdss, já são horas de acordar!". Mas excluindo essas tiradas rabugentas, até vou sorridente para o escritório, alheia nos meus pensamentos e nas musiquinhas sabiamente escolhidas para o efeito. Mas há coisas que dão cabo deste sistema: chover torrencialmente e o multidão mal-disposta escolher os passeios da Baixa como terreno propício a batalha campal de chapéus-de-chuva "Ai não te desvias? Então pimba! Toma lá que já te molhaste!". Herdado o carácter fleumático por via paterna, geralmente faço a Baixa aos esses: ficar mal-disposta e molhada, para quê?
Mas há dias, em que uma qualquer chica esperta decide levar os miudos da creche a viajar nos SMTUC "porque é giro os putos verem como isto funciona", então o autocarro vai cheio de gente, com 4 tipas a tomar conta de 20 miudos com 7 anitos, alguns deles aos tombos, em pé, porque o autocarro vai cheio, e ainda há uma anormal que se vira para uma miudinha que choraminga assustada: "O que tu merecias era ir ali em pé". Acho isto um exemplo soberbo do que espera os futuros pais esperançosos nas gerações futuras.
Mas a cereja no topo do creme branco e ondulante de chantilli é mesmo ir à CGD, tirar o tiquet, esperar 45 minutos para ser atendida, e uma vez lá, ser informada que "nós aqui já não fazemos isso. Isso era da competência do balcão das informações, que foi extinto, mas substituído por aquele cúbico envidraçado", onde não há senhas, e se forma uma fila irregular, com velhotas, que de baixo dos seus setenta/oitenta anos se cansam das pernas, dos ossos, de X que não se cala, da fila que nunca mais avança, "e isto é uma coisa tão simples"... e eu olho para o lado e só me falta assobiar. Quando finalmente chega a minha vez, meia hora depois, tenho um funcionário mal-disposto por estar atrasado para o almoço, que me trata mal, e usa as perguntas como se fossem armas de arremesso: "mas dá inválido ou ilegível?", "já lhe perguntei, mas você não respondeu - enganou-se no código?" Ao que eu respondo, com frieza, que nunca uso a caderneta para fazer levantamentos, e que tenho muita pena de não terem um livro de reclamações.
Vou a espumar para casa, onde bato com as portas dos armários enquanto faço à pressa o almoço naquilo que resta da minha pausa para almoçar. Tenho sorte, porque tenho alguém compassivo que me ouve e me chama à razão "Mas tu já sabes que as coisas funcinam assim! Porque estás tão irritada?", e eu penso que é desta que vou esgrimir o meu chapéu-de-chuva como se de uma espada se tratasse, para ao fazer alguém mais miserável que eu, me sentir finalmente vingada.